quarta-feira, 28 de julho de 2010




"UMA ÁRVORE QUE CAI FAZ MAIS BARULHO QUE UMA FLORESTA QUE CRESCE"







O blog Claraval tem a enorme alegria de publicar a carta que o padre salesiano uruguaio Martín Lasarte, que trabalha em Angola, endereçou ao jornal norte-americano The New York Times no último 06 de abril. Nela expressa seus sentimentos diante da onda midiática despertada pelos abusos sexuais de alguns sacerdotes enquanto manifesta sua surpresa diante do desinteresse que o trabalho de milhares de religiosos suscita nos meios de comunicação.

Eis a carta.

Querido irmão e irmã jornalista: sou um simples sacerdote católico. Sinto-me orgulhoso e feliz com a minha vocação. Há vinte anos vivo em Angola como missionário. Sinto grande dor pelo profundo mal que pessoas, que deveriam ser sinais do amor de Deus, sejam um punhal na vida de inocentes. Não há palavras que justifiquem estes atos. Não há dúvida de que a Igreja só pode estar do lado dos mais frágeis, dos mais indefesos. Portanto, todas as medidas que sejam tomadas para a proteção e prevenção da dignidade das crianças será sempre uma prioridade absoluta.

Vejo em muitos meios de informação, sobretudo em vosso jornal, a ampliação do tema de forma excitante, investigando detalhadamente a vida de algum sacerdote pedófilo. Assim aparece um de uma cidade dos Estados Unidos, da década de 70, outro na Austrália dos anos 80 e assim por diante, outros casos mais recentes...

Certamente, tudo condenável! Algumas matérias jornalísticas são ponderadas e equilibradas, outras exageradas, cheias de preconceitos e até ódio.

É curiosa a pouca notícia e desinteresse por milhares de sacerdotes que consomem a sua vida no serviço de milhões de crianças, de adolescentes e dos mais desfavorecidos pelos quatro cantos do mundo!


Penso que ao vosso meio de informação não interessa que eu tenha precisado transportar, por caminhos minados, em 2002, muitas crianças desnutridas de Cangumbe a Lwena (Angola), pois nem o governo se dispunha a isso e as ONGs não estavam autorizadas; que eu tenha tido de enterrar dezenas de pequenos mortos entre os deslocados de guerra e os que retornaram; que nós tenhamos salvo a vida de milhares de pessoas no México com apenas um único posto médico em 90.000 km2, assim como com a distribuição de alimentos e de sementes; que nós tenhamos dado a oportunidade de educação, nestes 10 anos de escolas, para mais de 110.000 crianças...

Também não é do vosso interesse que, com outros sacerdotes, tivemos de socorrer a crise humanitária de cerca de 15.000 pessoas nos aquartelamentos da guerrilha, depois de sua rendição, porque os alimentos do Governo e da ONU não estavam chegando ao seu destino.

Não é notícia que um sacerdote de 75 anos, o padre Roberto, percorra, à noite, a cidade de Luanda, curando os meninos de rua, levando-os a uma casa de acolhida, para que se desintoxiquem da gasolina; que alfabetize centenas de presos; que outros sacerdotes, como o padre Stefano, tenham casas de passagem para os menores que sofrem maus tratos e até violências e que procuram um refúgio.

Tampouco que Frei Maiato, com seus 80 anos, passe casa por casa confortando os doentes e desesperados.

Não é notícia que mais de 60.000 dos 400.000 sacerdotes e religiosos tenham deixado sua terra natal e sua família para servir os seus irmãos em um leprosário, em hospitais, em campos de refugiados, em orfanatos para crianças acusadas de feiticeiras ou órfãos de pais que morreram de Aids, em escolas para os mais pobres, em centros de formação profissional, em centros de atenção a soropositivos... ou, sobretudo, em paróquias e missões dando motivações às pessoas para viver e amar.

Não é notícia que meu amigo, o padre Marcos Aurélio, por salvar jovens durante a guerra de Angola, os tenha transportado de Kalulo a Dondo, e ao voltar à sua missão tenha sido metralhado no caminho; que o irmão Francisco, com cinco senhoras catequistas, tenham morrido em um acidente na estrada quando iam prestar ajuda nas áreas rurais mais recônditas; que dezenas de missionários em Angola tenham morrido de uma simples malária por falta de atendimento médico; que outros tenham saltado pelos ares por causa de uma mina, ao visitarem o seu pessoal. No cemitério de Kalulo estão os túmulos dos primeiros sacerdotes que chegaram à região... Nenhum passa dos 40 anos.


Não é notícia acompanhar a vida de um Sacerdote “normal” em seu dia a dia, em suas dificuldades e alegrias, consumindo sem barulho a sua vida a favor da comunidade que serve. A verdade é que não procuramos ser notícia, mas simplesmente levar a Boa-Notícia (Evangelho = Boa-Notícia), essa notícia que sem estardalhaço começou na noite da Páscoa. Uma árvore que cai faz mais barulho do que uma floresta que cresce.

Não pretendo fazer uma apologia da Igreja e dos sacerdotes. O sacerdote não é nem um herói nem um neurótico. É um homem simples, que, com sua humanidade, busca seguir Jesus e servir os seus irmãos. Há misérias, pobrezas e fragilidades como em cada ser humano; e também beleza e bondade como em cada criatura...

Insistir de forma obsessiva e perseguidora em um tema perdendo a visão de conjunto cria verdadeiramente caricaturas ofensivas do sacerdócio católico na qual me sinto ofendido.

Só lhe peço, amigo jornalista, que busque a Verdade, o Bem e a Beleza. Isso o fará nobre em sua profissão.


Em Cristo,
Pe. Martín Lasarte, SDB.

terça-feira, 13 de julho de 2010

A VERDADE É POLITICAMENTE

INCORRETA

Pe. Francisco Faus

Leio na Folha de São Paulo de 9 de julho de 2010 (pág. A3), sob o título “Divórcio”, a crítica indignada de uma leitora de Indaiatuba ao artigo de Ives Gandra, publicado na mesma Folha (”Cotidiano” de 8 de julho) e intitulado “O divórcio relâmpago fragiliza ainda mais a família”. A missivista declara que o autor do artigo está desatualizado: “Informo que a sociedade mudou, hoje pais dividem a guarda dos filhos com suas mães e têm maiores condições emocionais e psicológicas de trazer aos filhos o que, de fato, significa um bom relacionamento. Os filhos não se privam do carinho e do amor de seus pais simplesmente porque estes resolvem tentar ser felizes num relacionamento pleno e satisfatório”.


A missivista quer informar o desavisado articulista. Acontece que eu também tenho alguma coisa a informar. Faz mais de quarenta anos que trabalho, de modo habitual, na orientação e apoio de estudantes, moças e rapazes, entre 12 e 25 anos de idade. Vários milhares de adolescentes e jovens já me contaram as suas alegrias, tristezas, ideais e lutas. Tenho, assim, apalpado diariamente “a vida como ela é”, por isso, tenho podido conhecer os efeitos do divórcio nos filhos: “na veia”, não em livros de sociologia ou psicologia.

Essa longa e vasta experiência me dá condições de afirmar, com conhecimento de causa, que em noventa por centro - pelo menos - dos casos, o divórcio dos pais causou nos filhos um trauma duradouro, provocando-lhes desorientação, amargura e, não raramente, distúrbios psíquicos. Sei que isto é verdade, mas sei também que, nos convencionalismos atuais, não há nada tão politicamente incorreto como a verdade.

Nunca me esquecerei da conversa com uma menina, estudante de colégio, que sofria com a separação dos pais. Ela teve oportunidade de ler os Manuscritos Autobiográficos de Santa Teresinha. Ficou deslumbrada com o ambiente de união e carinho familiar que transparece em cada página dessa autobiografia. Pouco depois da leitura do livro, disse-me com voz impregnada de tristeza: - “Padre, como era linda a família de Santa Teresinha! Eu acho que uma filha de pais separados nunca poderá ser santa…”. Ao ouvir isso, senti um sobressalto, uma punhalada no coração, e respondi-lhe com veemência: - “Claro que poderá, minha filha! Estou certo de que você, com a ajuda de Deus, poderá vir a ser uma grande santa”.

Causa-me muita pena, à vista dessas experiências, ouvir pais de família - obcecados pelas dificuldades da vida -, falarem do seu “direito de serem felizes”, ainda que isso signifique deixar os filhos numa posição ambígua e quase sempre prejudicial. Creio que o mais belo “direito” do casal - como de todos nós, filhos de Deus -é o “dever” de lutar, de entregar-nos, de sacrificar-nos dando-nos cada vez mais para “fazermos felizes” os demais (a começar pelos filhos). E creio ainda que o egoísmo mais ou menos consciente do pai ou da mãe que, em grande número de divórcios, é o que os leva à separação, pode-se tornar facilmente num buraco negro onde se enterra a felicidade própria e a dos filhos.

Não quero nem posso julgar o drama da missivista de Indaiatuba. Seria leviano e injusto formular sobre ela um juízo negativo. Por isso, peço a Deus que a abençoe, que lhe conceda a felicidade que seja possível alcançar nesta terra, e que a ajude também a envolver seus filhos em sentimentos e manifestações de carinho tais, que compensem a privação de um lar unido.

Fonte: /www.padrefaus.org/10/07/2010

quarta-feira, 30 de junho de 2010



ORAÇÃO PARA NÃO ABORRECER-SE






Ângelo Caldas


Há muito tempo que nós, os homens, perdemos o gosto pela solidão.

Achamos ótimo esse martelar constante do rádio com a última canção, do cinema, da televisão, e andamos à caça das grandes manchetes dos jornais com uma ansiedade quase mórbida...

Estamos excessivamente acostumados a todos esses estímulos externos, e o seu zumbido nos é tão familiar, tão congênito, que nos acontece como às crianças ricas, que necessitam de muitos brinquedos para não se aborrecerem.

Porque esta é a verdade, Senhor: sentimo-nos terrivelmente entediados quando estamos sós.

Vendemos a nossa intimidade porque nos espanta o vazio interior. Somos vazios por dentro. Com um vazio que dá vertigens.

Vivemos à flor da pele. Á flor dos sentidos... Estamos cheios de pressa, porque temos tanto que ver, que bisbilhotar, que ouvir, que ganhar e gastar...

Como um animalzinhho que tem os sentidos muito despertos, vivemos a curto prazo: prazo de sentidos. É preciso satisfazer o olho, o estômago e tudo o que há em nós de instintivo. Porque... dentro, não há nada.

Não gostamos de pensar, porque estamos sem resposta para as perguntas sérias, para os problemas de longo prazo e de largo alcance, que são os grandes problemas humanos nos quais, ao fim e ao cabo, sempre se acaba tropeçando contigo, Senhor.

Estamos vazios de idéias. Pressentimos que o importante está dentro de nós. Mas somos terrivelmente covardes. Fugimos.


Fugimos de nós mesmos, da nossa intimidade, que é onde nos encontramos cara a cara com o nosso destino, com o verdadeiro sentido da nossa vida, com aquela conversa interior onde Tu, Senhor, nos esperas para dialogar conosco...


Este diálogo salvador espanta-nos... E então fugimos, despistamos, fazemos por ganhar tempo, abrindo mais os olhos para o que reluz, a fim de matar melhor esse tédio interior que se transmuda pouco a pouco em remorso.

Dá-nos, Senhor, amor pela solidão. Por esta solidão do coração que nos convida, mesmo no meio de uma praça pública, em plena rua, a olhar para dentro de nós mesmos.

Dá-nos gosto pela reflexão espiritual, que é onde Tu, Senhor, que és Espírito, falas ao nosso espírito.

Ajuda-nos a preencher este tremendo vazio do nosso interior com a tua evocação e com a tua presença, para olharmos as coisas como tu as olhas, para julga-las como tu as julgas.

Protege-nos contra a fuga de nós mesmo e faz-nos encontrar, onde quer que estejamos, a sagrada solidão em que Tu te comunicas.




Fonte: CALDAS, Ângelo. Em conversa com Deus. Quadrante, São Paulo, 1989 (p. 7-8).


terça-feira, 22 de junho de 2010



O HOMEM E A MULHER






Padre Paulo Monteiro Ramalho




Gostaria de falar esta semana sobre a diferença entre o homem e a mulher.

Este é um tema importantíssimo para vivermos bem, no dia-a-dia, a caridade que Cristo nos pede. Como parte da caridade está em compreender, não compreenderemos bem um homem ou uma mulher (o irmão, a irmã, o pai, a mãe, o marido, a esposa) se não conhecemos a fundo as suas características. Cristo sabia perfeitamente estas diferenças, daí que sabia tocar profundamente no coração dos homens e das mulheres.

Infelizmente poucas pessoas têm consciência destas diferenças, o que leva a verdadeiros estragos na convivência, principalmente no matrimônio.

Em brevíssimos traços, podemos dizer o seguinte:

1. O homem, por natureza, é um ser, por assim dizer, mais "básico" (vê o mundo do ponto de vista lógico, racional), ao passo que as mulheres são mais complexas (veem o mundo numa perspectiva mais complexa, rica, humana, intuitiva, emocional).

Isto explica que:
- os homens sejam mais objetivos (a+b) e as mulheres mais subjetivas (mais complexas);
- os homens sejam mais “frios” (menos calorosos, menos afetivos, menos sensíveis) do que as mulheres;
- os homens sejam mais lógicos e frios na solução dos seus problemas, ao passo que as mulheres matizem mais os vários aspectos que envolvem os problemas;
- os homens consigam distanciar-se mais dos problemas, ao passo que as mulheres, pela sua sensibilidade mais aguçada, sofram mais, se envolvam mais com os problemas;
- os homens sejam mais abstratos e as mulheres sejam mais detalhistas (reparam nos detalhes);
- os homens sejam menos carentes e as mulheres mais carentes (de afetos, sentimentos);
- os homens se desestressem descansando a cabeça, não pensando em nada, ao passo que as mulheres se desestressam falando o que as preocupa;
- as mulheres falem “por gostar de falar” (externar os sentimentos) ao passo que os homens falam “quando precisam falar” (daí as mulheres falarem mais ao telefone....);
- os homens segmentem bem o que falam: falam aquele assunto e só aquele assunto; ao passo que as mulheres conectam um assunto com inúmeros outros assuntos.

2. O homem, por natureza, é um ser mais voltado para o mundo exterior, para as coisas, ao passo que as mulheres são mais voltadas para o mundo interior, para as pessoas.

Isto explica que:
- o tema preferido das mulheres é falar sobre vivências, experiências humanas, ao passo que o homem gosta de falar de conquistas, realizações (trabalho, projetos, futebol, etc);
- as mulheres se preocupem mais com as pessoas e com a sua pessoa: com a roupa que vestem, com o que os outros estão pensando dela, se está feliz ou não; ao passo que os homens não estão voltados para as coisas interiores: em geral, não se preocupam muito com a roupa que vestem, com o que os outros pensam dele, se está feliz ou não.

3. O homem, por natureza é mais “carnal”, ao passo que as mulheres são mais “pessoais”.

Isto explica que:
- os homens encontrem o sentimento de satisfação numa comida, numa bebida, ao passo que as mulheres se sentem satisfeitas quando são amadas, queridas.

Como se vê, há muitas diferenças entre os homens e as mulheres. De tal maneira que podemos dizer que é “quase um milagre” que se entendam. Mas é nesta diferença que está a riqueza, a complementaridade e a superação do amor.

Tendo em vista estas diferenças, seria muito bom ter umas dicas, principalmente, para o relacionamento entre marido e mulher: coisas a fomentar e coisas a evitar. É o que farei na próxima mensagem.

Uma santa semana a todos!

Pe. Paulo Monteiro Ramalho é sacerdote. Foi ordenado em 1993.Engenheiro Civil formado pela Escola Politécnica da USP, doutor em Filosofia pela Pontificia Università della Santa Croce, capelão do IICS - Instituto Internacional de Ciências Sociais. Atende direção espiritual na Igreja de São Gabriel em São Paulo.