quarta-feira, 30 de junho de 2010



ORAÇÃO PARA NÃO ABORRECER-SE






Ângelo Caldas


Há muito tempo que nós, os homens, perdemos o gosto pela solidão.

Achamos ótimo esse martelar constante do rádio com a última canção, do cinema, da televisão, e andamos à caça das grandes manchetes dos jornais com uma ansiedade quase mórbida...

Estamos excessivamente acostumados a todos esses estímulos externos, e o seu zumbido nos é tão familiar, tão congênito, que nos acontece como às crianças ricas, que necessitam de muitos brinquedos para não se aborrecerem.

Porque esta é a verdade, Senhor: sentimo-nos terrivelmente entediados quando estamos sós.

Vendemos a nossa intimidade porque nos espanta o vazio interior. Somos vazios por dentro. Com um vazio que dá vertigens.

Vivemos à flor da pele. Á flor dos sentidos... Estamos cheios de pressa, porque temos tanto que ver, que bisbilhotar, que ouvir, que ganhar e gastar...

Como um animalzinhho que tem os sentidos muito despertos, vivemos a curto prazo: prazo de sentidos. É preciso satisfazer o olho, o estômago e tudo o que há em nós de instintivo. Porque... dentro, não há nada.

Não gostamos de pensar, porque estamos sem resposta para as perguntas sérias, para os problemas de longo prazo e de largo alcance, que são os grandes problemas humanos nos quais, ao fim e ao cabo, sempre se acaba tropeçando contigo, Senhor.

Estamos vazios de idéias. Pressentimos que o importante está dentro de nós. Mas somos terrivelmente covardes. Fugimos.


Fugimos de nós mesmos, da nossa intimidade, que é onde nos encontramos cara a cara com o nosso destino, com o verdadeiro sentido da nossa vida, com aquela conversa interior onde Tu, Senhor, nos esperas para dialogar conosco...


Este diálogo salvador espanta-nos... E então fugimos, despistamos, fazemos por ganhar tempo, abrindo mais os olhos para o que reluz, a fim de matar melhor esse tédio interior que se transmuda pouco a pouco em remorso.

Dá-nos, Senhor, amor pela solidão. Por esta solidão do coração que nos convida, mesmo no meio de uma praça pública, em plena rua, a olhar para dentro de nós mesmos.

Dá-nos gosto pela reflexão espiritual, que é onde Tu, Senhor, que és Espírito, falas ao nosso espírito.

Ajuda-nos a preencher este tremendo vazio do nosso interior com a tua evocação e com a tua presença, para olharmos as coisas como tu as olhas, para julga-las como tu as julgas.

Protege-nos contra a fuga de nós mesmo e faz-nos encontrar, onde quer que estejamos, a sagrada solidão em que Tu te comunicas.




Fonte: CALDAS, Ângelo. Em conversa com Deus. Quadrante, São Paulo, 1989 (p. 7-8).


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