domingo, 23 de janeiro de 2022

O RESSENTIMENTO. PARTE 2

 


Meditar sobre quem nos feriu...

Como? 


Terminamos o post anterior afirmando que, para combatermos o ressentimento, deveríamos, antes de tudo, procurarmos um bom diretor espiritual. Suficiente? Não. John D. Nugent dá outras indicações. A primeira delas exige que saibamos ver quem nos ofendeu com outro olhar:

"Depois (de ouvir o conselheiro) meditaremos alguns momentos sobre a pessoa que nos feriu, não de maneira vingativa, mas de forma compassiva e compreensiva. Não há ninguém debaixo do céu que não tenha algo de bom, e se pensarmos no outro sem prevenções, descobriremos que esta regra também se aplica a ele. Lancemos mão de um pouco de fair-play: houve momentos no nosso passado em que nós mesmos machucamos os que nos cercavam ou fomos injustos com eles. Muito razoavelmente, perdoamo-nos essas nossas faltas, reconhecemos a nossa falibilidade humana, e aceitamos que houve épocas em que o nosso desempenho não era lá muito primoroso; agora, trata-se de aplicar exatamente a mesma tolerância à pessoa que nos ofendeu. Pode ser que ela tenha cometido um grande erro ao dizer ou fazer o que fez, mas com toda a certeza não detém o monopólio de todos os erros. E não preciso ser matemático para descobrir que o normal será perdoá-la sem reservas, e com o mesmo coração grande que perdoamos a nós mesmos. 

Mas ainda não basta. Ao perdoarmos os outros, facilmente nos sentimos mais elevados a grandes alturas morais; no entanto, esse é um pedestal ao qual nunca deveríamos subir, pois as nossas cabeças simplesmente não suportam as altitudes elevadas: ao perdoar, costumamos assumir ares de falsa dignidade, pensando em como somos generosos. também esta é uma atitude que será preciso superar: se pretendemos estar afinados  com a realidade, temos de chegar a perceber que, no fundo, não existe nada a ser perdoado. É bom pensar que todo o mundo, mesmo a pessoa mais desagradável, de ordinário faz o melhor que sabe. se soubesse mais, faria melhor. Dadas as limitações da condição humana, as circunstâncias da situação e as pressões internas que todos sofrem e que nós não conhecemos, em muitas ocasiões era impossível ou muito difícil que essa pessoa se comportasse de maneira diferente do que fez. Esqueça a história de "perdoar" com o ar superior do ofendido: não há nada a perdoar. Quem concede o perdão assume às vezes poses demasiado farisaicas. 

Tudo requer esforço

(...)

Em suma , livrar-se dos ressentimentos não é um acontecimento; é um processo, e requer esforço. E se queremos sentir-nos livres em nós mesmos e conhecer a paz de espírito, temos de levar a cabo esse esforço. Os ressentimentos não se vão embora sozinhos; simplesmente escondem-se durante algum tempo e acabam por explodir mais tarde, no pior momento possível. (...).

Quando expomos consistentemente e com sinceridade os nossos velhos ressentimentos ao nosso conselheiro espiritual, e lançamos fora os novos à medida que se apresentam, acaba por produzir-se em nós uma mudança muito profunda da atitude que temos diante dos outros. Libertamo-nos da nossa velha sensibilidade espinhenta e deixamos de procurar ocasiões para nos sentirmos insultados. Pomos fim às nossas infantilidades absurdas - como por exemplo exigir que os outros nos peçam desculpas ou insistir nalguma demonstração tola de dignidade -, e uma tolerância ampla, que nos custou trabalho desenvolver, acaba por tornar-se quase instintiva, de modo que chegamos a desenvolver uma genuína compreensão das limitações alheias". 


Excerto de "Nervos, Preocupações e Depressão", John D. Nugent, São Paulo: Quadrante, 1992, p. 90-92.


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